Professor Leandro Bravo

CAPÍTULO 10 – Morte e vida

CAPÍTULO 10

 

Morte e vida

 

Após a queda de Aladar e Ventania, Átila empurrou Isla derrubando-a no chão. 

Em seguida, ergueu-a com força pelo braço mandando que subisse em seu cavalo e voltou a desamarrar o animal. Suas mãos, porém, tremiam. Por conta disso, ele demorou bem mais do que gostaria para soltar o laço. 

Assim que desatou a corda montou sobre o cavalo, mas Isla buscou fugir saltando de volta para o chão. Átila esforçou-se para impedi-la, mas acabou desequilibrando-se, e desse modo, caiu do cavalo.

A princesa, aproveitando que ele estava caído enquanto ela achava-se de pé, correu em direção ao vale.

Nisto, Átila levantou-se e pegou seu arco e flecha. O ódio que sentiu por conta da atitude da princesa, fez com que ele, repentinamente, desistisse de raptá-la e passasse a querer matá-la.

O guarda correu atrás de Isla e avistou a moça encontrando-se com Aladar no interior do vale. Neste momento, a princesa entrelaçou seus braços ao redor do pescoço de Aladar, e ele, por sua vez, girou-a no ar.

Então, Átila, já fora de si, entesou o arco e atirou na direção de Isla. Mas Aladar viu e conseguiu desviar a lança com seu escudo de ferro, o qual havia trazido na mochila e agora estava em sua mão esquerda.

O guarda pegou outra flecha, mirou e atirou.

Tshiiiiiu… bein ein ein.

Aladar parou novamente a flecha com o seu escudo. 

Então, Isla, que estava posicionada atrás do soldado, percebeu-se próxima ao tronco de uma árvore espessa, ela, então, saltou para proteger-se bem atrás desta árvore. 

Tshiiiiiiiiiu.

Esta terceira flecha quase acertou-a. Mas, ao invés disso, ficou cravada no tronco da árvore. 

Átila, neste momento, percebeu que havia ficado sem munição. Assim, correu afobadamente na direção do seu cavalo. Então, quando o animal começou a bater asas para levantar voo, o arco caiu de sua mão e Aladar viu.

Rapidamente, o soldado arrancou a flecha fincada na árvore e disparou a fim de pegar a arma que havia sido derrubada no solo. E Isla foi atrás dele.

Átila já estava há uns dez metros de altura e cinco de distância, quando Aladar armou o arco e apontou a flecha em sua direção. Ele concentrou-se, mirou bem, mas a princesa segurou a haste da flecha, impedindo-o.

— O que você está fazendo? Ele vai fugir! — angustiou-se Aladar.

— Não… pois você pode acertar o cavalo — suplicou Isla.

Aladar, então, vendo o terror exposto nos traços do rosto de Isla, lembrou-se de que no início da jornada eles só haviam entrado na Floresta dos Dragões porque a moça, na ocasião, não aceitou abandonar Nobre, seu amado cavalo.

— Ele fugiu… — disse Isla. — Mas pagará pelo que fez. Mandarei um exército atrás dele. 

Aladar ficou observando enquanto a figura de Átila sobre o cavalo alado diminuía no horizonte. Este tipo de cena, assistir cavalo e cavaleiro em pleno voo, sempre havia impressionado-lhe. 

Mas então recordou-se de Ventania e partiu outra vez para o interior do vale, acompanhado pela princesa.

Eles encontraram o cavalo mancando com a flecha ainda cravada em seu antebraço. Aladar puxou a lança com bastante cuidado. Depois, fez um torniquete usando um pano que trazia na mochila que estava sendo carregada pelo próprio Ventania.

— Mesmo ferido ele nadou muito bem… — disse Aladar. — Foi ele que me carregou em segurança até a margem rio.

Nisto, Isla acariciou a crina do cavalo. Mas, em seguida, a moça deu um sobressalto:

— Aladar — disse ela —, o profeta nos revelou mais cedo que alguém morreria no vale. Quando você apareceu… cheguei a ter medo de que fosse você, mas agora…

— Onde Cecília está?

— Vem que eu te mostro! — disse Isla ao sair correndo, acompanhada por Aladar e até Ventania, mesmo que mancando.

Assim, quando, finalmente, chegaram ao local em que Isla havia deixado os adolescentes, encontraram Nestor com os olhos inchados de tanto chorar e Cecília deitada sobre o seu colo.

Ela está morta! — disse o garoto.

Aladar imediatamente desabou, batendo os joelhos violentamente contra o chão. Uma sensação horrível inundou sua alma, pois ele havia falhado. Parecia que iria entrar em um colapso nervoso quando um filme passou em sua mente. As cenas eram amargas. Ele via Clara expirando… via a si mesmo abraçando Dona Armênia sem conseguir acreditar… pensando que tudo aquilo não podia estar acontecendo, não de verdade. E, neste momento, era Cecília que havia partido.

Assim, ele levou as mãos à cabeça e deitou-se sobre a relva. 

Eles haviam chegado tão perto. “Estamos no vale das revelações, só precisávamos achar as folhas medicinais” pensava consigo. “Por quê? Por quê?” 

— Lembro-me das palavras do mensageiro do Rei… — disse Isla soluçando ao mesmo tempo em que despertava Aladar das profundezas de seu íntimo.

Nisto Aladar olhou dentro dos olhos de Isla. Porém, um sentimento de culpa logo surgiu em seu coração. Se ele não tivesse entrado na floresta atrás da moça por quem, agora, estava apaixonado, talvez Cecília ainda estivesse viva. Ele sentia que devia ter se esforçado mais.

Ezequiel nos disse que a fé verdadeira no Rei que está nos céus pode alcançar milagres — insistiu a princesa.

Aladar apertou os olhos e virou o rosto na direção de Nestor e Cecília. Seu irmão estava paralisado enquanto mantinha os olhos fechados.

Assim, o soldado colocou-se de pé e caminhou até os dois. Agora, recordava-se da cura que mais cedo ele próprio havia alcançado.

Portanto, ele abaixou-se e abraçou Nestor e Cecília. Isla chegou-se a eles puxando Ventania pelo cabresto e pôs a mão esquerda sobre o ombro de Aladar. 

Vamos clamar ao Soberano Rei — pediu o rapaz com o coração cheio de fé e esperança. — Haverá alguma coisa impossível a Ele?

Logo, Aladar dirigiu palavras de súplicas com plena certeza de fé ao Rei.

Assim, em alguns instantes ele observou um clarão encher totalmente o vale. Em seguida viu o Rei que habita nos céus em pé bem diante dele e imediatamente sentiu uma paz maravilhosa em seu coração.

Isla sentiu seus olhos sendo tocados, voltando, deste modo, a enxergar nitidamente.

Então, Nestor percebeu Cecília movendo-se em seu colo. Ela, portanto, abriu os olhos como quem desperta de um sono profundo e encarou seu amigo inseparável. Aladar levantou Cecília puxando-a pela mão e a menina ficou de pé. 

Logo, todos abraçaram-se, de modo que até Ventania, o qual não estava mais mancando, pôs o focinho dentro daquele abraço. 

Neste momento, as lágrimas ainda escorriam pela face de cada um deles… mas, agora, essas lágrimas expressavam a mais pura felicidade. E em meio a soluços eles agradeceram ao Rei Celestial.  

***

Mais tarde, quando eles estavam subindo o monte para retornarem à cidade, Aladar compreendeu que logo Isla voltaria ao seu reino, e ele poderia não ter mais a chance de declarar-se à princesa.

— Espere… Preciso te dizer algo muito importante — pediu tocando nas costas da moça.

— O que foi? — respondeu Isla sorrindo como se já soubesse o que ele ia dizer.

— É que… estou completamente apaixonado por você! — anunciou Aladar.

Ela, então, respondeu com delicadeza:

— Eu também estou apaixonada por você. E nunca havia sentido isso antes. E isso é assustador e maravilhoso ao mesmo tempo. Faz algum sentido?

— Faz todo o sentido — respondeu Aladar mal conseguindo conter-se.

Sabendo que os príncipes e as princesas tinham o direito de escolher com quem iriam se casar do mesmo modo que qualquer pessoa comum, Aladar continuou:

— Você… você gostaria de se casar comigo?

— Sim. — disse Isla com receio de que seu coração não pudesse suportar tanta alegria, e assim, respirava com certa dificuldade. Eu iria amar! 

Então, eles se beijaram. 

— A vida pode ser tão simples e tão boa? — perguntou Isla.

Mas Aladar respondeu com um abraço. Os dois sentiam-se como se estivessem flutuando no ar. Afinal, sabiam que a partir deste momento poderiam ficar juntos pelo resto de suas vidas.

Nestor enxugou as lágrimas que escorriam pela face de Cecília. A felicidade que sentiam parecia não ter mais fim.

***

Uma hora depois o quarteto retornava à Cidade Edificada sobre o Monte, testemunhando pelas ruas tudo o que havia acontecido, e contagiando, deste modo, os habitantes locais

Na verdade, agora, os cidadãos da cidade sabiam exatamente quem era Isla. Pois seu pai havia chegado na cidade e a notícia de que o mensageiro Ezequiel tinha guiado uma princesa até o Vale das Revelações espalhou-se como cheiro de torta que acaba de sair do forno.

Ao aproximarem-se da pousada onde estavam hospedados. Isla pôde avistar seu pai, o rei Roberto III. Junto a ele havia muitos guardas e até mesmo o governador da Cidade Edificada sobre o Monte.

No mesmo instante, a princesa correu em direção ao seu pai jogando-se em seus braços como se ainda fosse uma criança, o que arrancou risos de todos os que assistiam a cena.

Aladar e Nestor pararam junto deles. Cecília montava Ventania.

— Estes são meus amigos! — disse Isla sorrindo amavelmente.

Roberto III, então, cumprimentou um por um. Nisto, Isla ajeitou o vestido ainda sujo de terra com as mãos e resolveu dizer logo a seu pai:

— Aladar salvou minha vida várias vezes desde que o conheci. Ele é um homem temente ao Rei Celestial. E… estou apaixonada por ele… aliás, pouco tempo atrás ele me pediu em casamento e… eu aceitei.

Então, Roberto observou o rapaz por alguns segundos e surpreendentemente disse somente:

— Espero que vocês sejam felizes!

***

À noite, os noivos acertaram os detalhes do casamento com o rei Roberto III. Ficou combinado que eles casariam somente quando chegassem no Reino da Benignidade. E por se casar com Isla, Aladar receberia o título de duque. Pois, dessa forma, o rapaz se tornaria integrante da família real.

Em dois dias, eles partiriam para buscar o cavalo Nobre na Hospedagem do Sossego e em seguida iriam para a Vila da Mansidão, onde o rei daria ordens para que o vilarejo fosse reconstruído. Por último, fariam uma visita à Vila da Humildade, onde tanto a mãe de Aladar, Ana, quanto a mãe de Cecília, Dona Armênia, seriam convidadas para morar no Reino da Benignidade.

Claro que a essa altura, um mensageiro já havia sido encaminhado para a Vila da Humildade com o objetivo de transmitir as boas notícias às duas mulheres, tanto no que se refere à cura de Cecília quanto ao casamento de Aladar e Isla. 

No dia seguinte, durante a tarde, os quatro estavam sentados em frente a uma fonte chamada Contentamento, no quintal do governador da cidade, o qual havia recebido-os como hóspedes.

— É possível sentir tanto amor assim? — perguntou Isla com cara de apaixonada. — Chega a assustar.

— Assustar? — perguntou Aladar segurando forte a mão da princesa.

— Sim. Fico apavorada em pensar que toda essa alegria possa acabar de repente. Afinal, existem tantos perigos neste mundo.

— Não tenha medo… confie Naquele que é poderoso para sustentar todas as coisas — disse Aladar carinhosamente.

Cecília estava admiravelmente encantada com tudo o que havia acontecido. E o jardim do governador possuía uma beleza que agradava profundamente seus observadores, estando repleto de árvores frutíferas e pássaros cantando ao redor de uma fonte de águas que neste momento brilhavam devido ao reflexo do sol.

O cabelo dela havia parado de cair, então, ela tinha raspado os fios que sobraram para não ficar esquisito. No entanto, agora usava um chapéu de abas largas enfeitado com flores coloridas de tecido, o qual o rei Roberto havia lhe dado, e como sua pele já tinha recuperado o estado de hidratação habitual, Cecília voltou a ser bonita, na verdade, seu rosto arredondado parecia ainda mais formoso do que antes. Entretanto, ela já não ligava tanto para isso.

— Imagine todas as aventuras que nos aguardam no Reino da Benignidade? — entusiasmou-se Nestor.

— Chega de aventuras Nestor — respondeu prontamente Cecília sorrindo com ar de sabedoria. — Eu só quero viver em paz… com as pessoas que amo… e na presença do Rei Celestial. Não existe nada melhor na vida.

— Eu concordo — afirmou Aladar molhando a mão nas águas da fonte.

Depois, com os dedos molhados ele ajeitou cuidadosamente uma mecha de cabelo atrás da orelha de Isla.

Tudo o que mais desejo agora é ficar com você!disse Aladar.

Isla riu. A moça experimentava seu coração bater com toda a força da paixão. Assim, olhando nos olhos dele com todo seu amor, ela disse:

— Vamos ter fé!

 

FIM

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